quarta-feira, 26 de fevereiro de 2014

Subaru detecta forma rara de azoto no Cometa ISON



(Astronomia On Line - Portugal) Uma equipa de astrónomos, liderada pelo candidato a doutoramento Yoshiharu Shinnaka e pelo professor Hideyo Kawakita, ambos da Kyoto Sangyo University, observou com sucesso o Cometa ISON durante o seu aumento de brilho em meados de Novembro de 2013. O espectrógrafo HDS (High Dispersion Spectrograph) do Telescópio Subaru detectou duas formas de azoto (ou nitrogénio) - 14NH2 e 15NH2 - no cometa. Esta é a primeira vez que os astrónomos anunciaram uma clara detecção do isótopo relativamente raro 15NH2 num único cometa e que também mediram a abundância relativa de duas formas diferentes de azoto na amónia cometária (1.ª figura). Os seus resultados suportam a hipótese da existência de dois reservatórios distintos de azoto na nuvem (nebulosa solar) densa e maciça a partir do qual o Sistema pode ter-se formado e evoluído.

Porque é que a equipa concentrou-se em estudar estas formas de azoto no cometa? Os cometas são objectos relativamente pequenos do Sistema Solar compostos por gelo e poeira, formados há 4,6 mil milhões de anos na nebulosa solar quando o nosso Sistema Solar estava na sua infância. Dado que geralmente residem nas regiões frias longe do Sol, por exemplo na cintura de Kuiper e na Nuvem de Oort, provavelmente preservam informação acerca das condições físicas e químicas do início do Sistema Solar. As formas diferentes e abundâncias da mesma molécula fornecem informações sobre a sua origem e evolução. Seriam de um berço estelar (uma nuvem interestelar primordial) ou de uma nuvem distinta (nebulosa solar) que formou a estrela do nosso Sistema Solar, o Sol? Os cientistas não compreendem ainda muito bem como as moléculas dos cometas se separam em isótopos com abundâncias diferentes. Os isótopos de azoto presentes em amónia (NH3) podem ser a chave.

O composto químico amónia (NH3) é uma molécula particularmente importante, porque é o volátil (substância que vaporiza) com azoto mais abundante no gelo cometário e uma das moléculas mais simples num grupo amino (-NH2) intimamente relacionado com a vida. Isto significa que estas formas diferentes de azoto podem ligar os componentes do espaço interestelar com a vida na Terra como a conhecemos.

Como a amónia é o principal transportador de azoto num cometa, é necessário limpá-la da abundância relativa dos seus isótopos para entender como 15NH2 se separa em moléculas cometárias. No entanto, a detecção directa da amónia cometária é difícil, e existem apenas alguns relatos da sua detecção clara. Portanto, a equipa concentrou-se no estudo da forma de NH2 desenvolvida após a quebra da amónia pela luz ("fotodissociação") na cabeleira do cometa. A equipa teve a sorte de observar o cometa à medida que se aproximava do Sol, quando a sua composição gelada evaporava. Também tiveram sorte que o NH2, um derivado da amónia (NH3), é fácil de observar no comprimento de onda óptico, e a abundância relativa dos isótopos de azoto na amónia cometária é provavelmente próxima da de NH2.

A equipa usou o HDS do Telescópio Subaru para observar com sucesso o Cometa ISON nos dias 15 e 16 de Novembro, após o aumento de brilho do cometa a 14 de Novembro. A observação detectou claramente 15NH2 no Cometa ISON, e a equipa inferiu que a proporção de amónia cometária 14N/15N (139±38) é consistente com a média (14N/15N~130) dos espectros de outros 12 cometas. Por outras palavras, o ISON tem uma abundância relativa típica de 14N/15N na amónia cometária.

Estes resultados suportam a hipótese da existência de dois reservatórios distintos de azoto na nebulosa solar: 1) o gás primordial N2 tendo um valor protosolar de 14/15N, e 2) moléculas menos voláteis e provavelmente sólidas com uma proporção de aproximadamente 14N/15N~150 na nebulosa solar. No caso de uma nuvem com um denso núcleo molecular, o rácio isotópico do cianeto de hidrogénio (HCN) é semelhante ao dos cometas enquanto a sua proporção de amónia é diferente do seu valor cometário (2.ª figura).

Isto pode significar que a amónia formou-se num ambiente poeirento a baixas temperaturas, não no gás da nuvem molecular. As experiências de laboratório mostram que as várias moléculas complexas podem formar-se na superfície de poeiras a baixas temperaturas. Se a molécula de amónia formou-se na superfície de poeira a baixas temperaturas, o núcleo cometário pode conter uma molécula complexa que se relaciona com a origem da vida, para além da amónia. A ser verdade, levanta a possibilidade de que os cometas tenham trazido estes materiais para a Terra.

No futuro, a equipa gostaria de aumentar a amostra de cometas para o qual os rácios isotópicos de azoto na amónia cometária foram determinados. Gostariam também de realizar análises laboratoriais de 15NH2 para obter proporções isotópicas mais precisas. Numa maior escala, a equipa espera investigar a origem do Cometa ISON e os mecanismos que provocaram o seu aumento de brilho, para que possamos melhor compreender a evolução do Sistema Solar.

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